Sunday, April 10, 2005

O beijo

Ainda hoje me lembro do dia em que me disseste adeus. Não foram as palavras magoadas. Não foram os olhares vazios e cansados. Foi o teu beijo. Nesse momento percebi que partirias para sempre.
Nesse dia tudo soava a despedida. Nem sei como não percebi os sinais. O Sol despia a sua capa de Verão para dar lugar a um Outono sorridente mas ao mesmo tempo melancólico. As folhas diziam o seu último adeus às árvores suas amantes num jogo de necessidades sublimadas e nunca realizadas.
A tarde parecia pintada a lápis de cor. O café onde nos sentámos não tinha o mesmo ar acolhedor de sempre. Trocámos conversas mas no fim nada foi partilhado. Nada mais tinhas para me dar. Os risos mecânicos e esforçados. A pele fria e triste. E mesmo assim eu não quis perceber.
Até que me beijaste. Foi aí que percebi. Tudo tinha mudado. Os nosso beijos sempre tiveram a marca do futuro, dos projectos a dois, dos sonhos por concretizar. Mas esse beijo nada tinha de futuro nele. Antes pelo contrário. Era marcado pela saudade. Por aquilo que tinha sido vivido e que tinha ficado para trás. Algures na estrada que foi de nós para ninguém.
Agora sofro quando recordo o teu beijo. Tento guardar dentro de mim as memórias desse tempo em que tudo o que eu queria era que o tempo parasse de andar. Mas as memórias parecem grãos de areia que teimam e fugir dos meus dedos. Perdi o controlo sobre tudo. Estou cativo numa prisão criada pela minha solidão e agora já não sei como sair. As paredes vão-se fechando a pouco e pouco sob o peso das lágrimas derramadas em vão. Como se essas lágrimas fossem trazer de volta aquela tarde de Verão em que me beijaste e disseste adeus.

0 Comments:

Post a Comment

<< Home